A recente decisão da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre a incidência de PIS/Cofins sobre os juros Selic promete ser um divisor de águas no cenário tributário brasileiro. A Receita Federal, até então, considerava a Selic como receita financeira, sujeita a uma alíquota de 4,65%. Entretanto, com a publicação do acórdão do STJ, ficou claro que prevaleceu o entendimento de que a Selic deve ser classificada como receita operacional, cuja alíquota é de 9,25%. Essa mudança de classificação pode resultar em um aumento significativo na carga tributária para os contribuintes, tornando essencial uma análise detalhada do tema.
Incidência de PIS e Cofins sobre a taxa Selic
Em junho, a 1ª Seção do STJ decidiu que incide o PIS e a Cofins sobre os juros Selic recebidos nos casos de repetição de indébito tributário (restituição de valores pagos a maior) e na devolução de depósitos judiciais ou pagamentos efetuados por clientes em atraso. Como a decisão foi proferida em recurso repetitivo, ela deverá ser seguida pelas instâncias inferiores do Judiciário. Isso significa que a decisão terá um efeito vinculante, impactando uma ampla gama de contribuintes.
A divergência em relação ao entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), que em 2021 afastou a incidência de IRPJ e CSLL sobre a Selic, adiciona uma camada extra de complexidade. O STF considerou que os valores da Selic são mera recomposição do patrimônio, não se inserindo no conceito de lucro. Portanto, esses valores também não compõem o conceito de receita para a incidência das contribuições. No entanto, o STJ aplicou um raciocínio diferente em relação ao PIS e à Cofins.
O STJ julgou recentemente sob o sistema de recursos repetitivos, o tema 1237 (REsp 2065817/RJ, REsp 2068697/RS, REsp 2075276/RS, REsp 2109512/PR, REsp 2116065/SC), que trata sobre a possibilidade de incidência das contribuições ao PIS/PASEP e COFINS sobre os valores de juros, calculados pela taxa SELIC, recebidos em face de repetição de indébito tributário, na devolução de depósitos judiciais ou nos pagamentos efetuados por clientes em atraso.
Foi firmada a seguinte tese:
“Os valores de juros, calculados pela taxa SELIC ou outros índices, recebidos em face de repetição de indébito tributário, na devolução de depósitos judiciais ou nos pagamentos efetuados decorrentes de obrigações contratuais em atraso, por se caracterizarem como Receita Bruta Operacional, estão na base de cálculo das contribuições ao PIS/PASEP e COFINS cumulativas e, por integrarem o conceito amplo de Receita Bruta, na base de cálculo das contribuições ao PIS/PASEP e COFINS não cumulativas.”
A classificação dos juros Selic como receita operacional
O relator do caso no STJ, ministro Mauro Campbell Marques, argumentou que os juros remuneratórios, que incluem a Selic, são considerados receita financeira e, portanto, parte do lucro operacional e da receita bruta. Por outro lado, os juros moratórios recebidos em repetição de indébito, incluindo a Selic, são vistos como recuperações ou devoluções de custos da receita bruta operacional. Ele explicou que os juros auferidos em pagamentos efetuados por clientes em atraso se classificam como indenização por lucros cessantes, enquanto os juros remuneratórios constituem renda ou lucro, sendo produto do capital.
No voto escrito, o relator detalha que os juros auferidos nos pagamentos efetuados por clientes em atraso, por serem espécie de juros de mora (devidos pela impontualidade do adimplemento), também se classificam como indenização por lucros cessantes para quem os recebe. Já os juros remuneratórios, diz ele, não são verbas indenizatórias, são remuneratórias, sendo os juros incidentes na devolução dos depósitos judiciais verba desta espécie (remuneratória), constituindo renda ou lucro, já que são produto do capital.
A natureza tributária dos juros Selic
Campbell Marques também destacou que a lei tributária estabelece que o aumento do valor do crédito dos contribuintes em razão da aplicação de determinada taxa de juros possui a natureza de receita bruta operacional, independentemente de ser oriunda de ato lícito ou ilícito. Esse entendimento é pacífico no STJ, que considera os juros incidentes na devolução dos depósitos judiciais como receitas financeiras integrantes do lucro operacional. Além disso, os juros moratórios na repetição de indébito tributário ou pagamentos em atraso são classificados como danos emergentes e lucros cessantes, compondo as recuperações de custos e o lucro operacional das empresas.
Procurada pelo Valor, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) afirmou por meio de nota que o julgamento reafirma a jurisprudência da 1ª Seção do STJ e que não apresentará recurso. A PGFN destacou que o STJ foi enfático ao afirmar que a condição dos juros de mora na repetição do indébito tributário como verba indenizatória a título de dano emergente pode retirar sua natureza jurídica de renda ou lucro, relevante para o IRPJ e para a CSLL, mas não a natureza de receita bruta, determinante para o PIS/Cofins.
A divergência jurídica e seus desdobramentos
A decisão do STJ não apenas altera a carga tributária dos contribuintes, mas também cria um cenário de incerteza jurídica. A divergência entre os entendimentos do STJ e do STF adiciona uma camada de complexidade ao cenário tributário brasileiro. Contribuintes e seus advogados agora enfrentam a difícil tarefa de navegar por essas águas turvas, buscando a melhor estratégia para minimizar os impactos financeiros desta decisão.
O que os contribuintes podem fazer
Diante desse novo cenário, é essencial que os contribuintes acompanhem de perto os desdobramentos dessa decisão e busquem orientação jurídica especializada para se adequarem às novas exigências tributárias. Advogados tributaristas podem ajudar a interpretar a decisão e a implementar estratégias para gerenciar o impacto financeiro potencial.
Além disso, é importante que as empresas revisem suas práticas contábeis e de compliance para garantir que estão em conformidade com a nova interpretação da lei tributária. A proatividade neste momento pode ser crucial para evitar surpresas desagradáveis no futuro.
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Conclusão
A decisão da 1ª Seção do STJ sobre a incidência de PIS/Cofins sobre os juros Selic representa um desafio significativo para os contribuintes, que poderão enfrentar um aumento considerável na carga tributária. A divergência entre os entendimentos do STJ e do STF adiciona uma camada de complexidade ao cenário tributário brasileiro. A publicação do acórdão do STJ e a classificação da Selic como receita operacional podem levar os contribuintes a terem que pagar a diferença entre as alíquotas de 4,65% e 9,25%, impactando diretamente suas finanças. É essencial que os contribuintes acompanhem de perto os desdobramentos dessa decisão e busquem orientação jurídica para se adequarem às novas exigências tributárias.
Em um ambiente onde a legislação tributária está em constante evolução, a atualização e a conformidade são fundamentais. Contribuintes e profissionais do direito tributário devem estar atentos e preparados para enfrentar os desafios impostos por essa nova interpretação legal.